Redes de Atenção e Proteção - Passo a passo
Considerando que um dos objetivos do Projeto Estratégico SEMEAR, em sua 3ª Etapa, consiste na “atuação integrada e articulada do Ministério Público do Paraná, nos âmbitos interno e externo, visando fomentar a implementação de políticas públicas intersetoriais para o enfrentamento ao uso abusivo e à dependência de drogas” em quatro (04) eixos1 (MPPR, 2016, p. 01).
Considerando a vinculação da Política sobre Drogas às Políticas de Saúde e de Atenção à Saúde Mental; essencial se faz ter presente que a Prevenção, o Atendimento e a Reinserção Social devem ser realizadas em consonância com a Política Integral de Cuidados às pessoas que fazem uso prejudicial de substâncias psicoativas.
Nessa perspectiva, o caráter transversal desta Política deve ser considerado, visto que exige conexão com as demais políticas sociais (Assistência Social, Educação, Cultura, Trabalho, Esporte, entre outras), as quais conjuntamente, de forma articulada, atuam na construção de estratégias capazes de garantir o cuidado integral dessas pessoas e de seus familiares.
Dentre as diferentes estratégias possíveis elencam-se três, haja vista o caráter simbólico de significação que possuem para a garantia da integralidade do cuidado aos usuários de substâncias psicoativas e de seus familiares. São elas: a) Intersetorialidade na atenção às pessoas que fazem uso problemático de álcool, crack e outras drogas - através da implementação e/ou fomento de Rede(s) de Atenção e Proteção; b) estabelecimento de Conselhos de Políticas sobre Drogas e c) realização de Conferências de Políticas sobre Drogas.
Especificamente sobre a estratégia da Intersetorialidade, pontua-se que “esta tem se apresentado como necessária dada a impossibilidade de os serviços responderem sozinhos as múltiplas demandas dos usuários, que vão desde o cuidado simultâneo ou complementar em outros serviços de saúde, a demandas sociais ou de proteção” (SOUZA et al, 2013, p.71).
Neste sentido, a Rede de Atenção e Proteção (intersetorial), a exemplo da forma como é compreendido o usuário - sob o âmbito de sua totalidade/integralidade – deve igualmente/preferencialmente ser vista em sua forma ampla e não fragmentada por segmento populacional ou política. Tal compreensão/forma de visualização de Rede é fundamental, posto que parte significativa do processo de atuação está na compreensão/reconhecimento de todos os atores que a integram de que se trata de uma responsabilidade mútua e compartilhada, independentemente da temática abordada.
Nesse sentido, no caso concreto, considerando a complexidade que envolve o espectro de fenômenos no âmbito do uso de substâncias psicoativas, mostra-se relevante que as questões específicas, como as referentes a Política sobre Drogas sejam, por exemplo, trazidas à Rede. Esta, de forma compartilhada - através de um núcleo, comissão temática, estudos de caso, etc – realiza apropriação e se responsabiliza, quanto às estratégias a serem adotadas (que podem se desenvolver através da construção de fluxos, protocolos, proposição de capacitações, etc) frente a demandas de usuários de substância psicoativa e/ou de seus familiares, de modo a assegurar a prevenção, o atendimento e a reinserção destes.
Salienta-se, nesse aspecto, que:
- As iniciativas constantes nos eixos A (Prevenção ao uso de drogas e formulação de políticas públicas sobre drogas) e B (Atendimento e reinserção social dos usuários de drogas) da 3ª Fase do Projeto Semear são complementares e integram um mesmo processo. Nesse sentido, devem ser entendidas a partir da perspectiva cultural do fazer social público, caracterizada por compartilhar o poder, negociar, trabalhar com autonomias, flexibilizar, compatibilizar agendas dos múltiplos atores e processos de ação.
- Não há uma metodologia única para implementação da Rede e de espaços de Controle Social, posto que se deve levar em conta as especificidades dos municípios, sendo um dos critérios balizadores o seu porte;
- As ações devem ser construídas em conjunto com os atores locais, governamentais ou não, prezando assim pela horizontalidade e articulação entre Ministério Público, órgãos gestores, e sociedade civil;
- O histórico do município, incluindo a organização e a articulação em Rede, assim como os espaços tradicionais e socioculturais de participação devem servir de base e fundamento para o trabalho conjunto com o Ministério Público;
- As premissas que regem os Eixos A e B têm como pilares a integralidade do sujeito, a transversalidade das Políticas sobre Drogas e a consolidação dos atores locais numa Rede de atendimento integral e integrada.
ATENDIMENTO E REINSERÇÃO SOCIAL DOS USUÁRIOS ABUSIVOS DE DROGAS
INICIATIVA - FOMENTO ÀS REDES DE ATENÇÃO E PROTEÇÃO
PASSO 1 – Cadastro virtual dos Municípios que integram a Comarca:
O Promotor de Justiça com atribuições preferencialmente nas áreas de defesa da saúde pública e de defesa dos direitos e garantias constitucionais (nada impedindo, todavia, a atuação do Promotor de Justiça local que exerça atribuições em outras áreas afetas à temática da drogadição, em concordância com os demais Promotores de Justiça lotados na Comarca detentores das atribuições específicas preferenciais) deverá:
1.1 Instaurar Procedimento Administrativo – PA, junto ao PRO-MP, para cada um dos Municípios integrantes da Comarca;
1.2 Em cada PA deve proceder o registro na área de atuação principal “Apoio Comunitário”, palavra-chave “Rede de Serviços – Drogadição”, com a seguinte descrição “Fomento a Rede de Serviços no Município de XXX”;
1.3 Finalmente, no campo vínculo com projeto/plano de ação institucional, selecionar a opção “Projeto Semear”.
PASSO 2 – Formação da Rede
2.1 Convidar os serviços governamentais e não-governamentais, tanto Municipais quanto Estaduais existentes no Município [integrantes da RAPS – Rede de Atenção Psicossocial, uma vez que abrange, além dos pontos de atenção na área de saúde (CAPS, Unidades Básicas de Saúde, NASF, Unidades de Acolhimentos, Serviços Residenciais Terapêuticos, Hospitais, Comunidades Terapêuticas, Consultórios na Rua, Centros de Convivência, SAMU), os poderes constituídos (Prefeituras Municipais e Câmara de Vereadores), os serviços e equipamentos das áreas da educação (escolas), assistência social (CRAS, CREAS, Centro POP, Centro da Juventude, etc…), segurança pública (Polícia Civil, Polícia Militar, Guarda Municipal), sistema de Justiça (OAB, Defensoria Pública, Ministério Público, Poder Judiciário) e outras entidades não governamentais que atendem usuários de drogas (Alcoólicos Anônimos, Amor Exigente, Alanon, Narcóticos Anônimos, Pastoral da Sobriedade), bem como as que contribuem para a promoção social das pessoas e de algum modo funcionam como fatores de proteção (Conselhos Municipais, Conselho Tutelar, Rotary, Lions, SESI-SENAC, grupos de Escoteiros, igrejas, etc.)], para participação em Fórum (reunião/roda de conversa) inicial sobre as perspectivas de atuação da Rede existente;
2.2 Realização de Fórum (reunião/roda de conversa). Na ocasião, poderá ser realizada exposição sobre as demandas (locais) referentes à temática que mais frequentemente chegam ao Ministério Público. Além disso, pode ser realizada uma exposição/apresentação sucinta do que foi identificado na análise documental realizada a partir da resposta aos Ofícios;
2.3 Formação de Comissão/Mesa Diretiva/Comitê Intersetorial da Rede, caso o Município ainda não possua. A comissão/mesa diretiva deve ser composta por atores que se disponibilizem a serem referências para a Rede. Seus componentes possuem papel fundamental para a estruturação/consolidação/fortalecimento da Rede;
2.4 Dar continuidade ao trabalho de Rede já desenvolvido. A Comissão/Mesa Diretiva tem papel crucial na convocação das próximas reuniões da Rede, responsabilizando-se pela definição de data, local e elaboração da Pauta;
2.4.1 Nas primeiras reuniões, caso não exista uma predefinição já estabelecida, seria relevante que os representantes da Rede realizassem algumas definições:
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Periodicidade das reuniões, tempo de duração e calendário;
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Local(is) de realização das reuniões;
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Necessidade de criação de Núcleos ou Comissões Temáticas (se sim, quantos, quais seriam, compostos por quais representantes, calendário de reuniões específico do Núcleo/Comissão, quem assumirá a função de Secretário – para registro das reuniões, de que forma serão socializadas as informações e construções de todos os Núcleos/Comissões caso tenham sido criados, de que forma será realizada a tomada de decisão conjunta por todos os atores, como será realizada a socialização e a publicização do material construído pela Rede, etc);
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Construção de Regimento Interno cuja regulamentação viabilizará a estrutura, organização e funcionamento da Rede, etc;
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Previsão de ações que motivem e propiciem a troca de experiências com outros Municípios que já possuam a Rede de Atenção e Proteção mais consolidada;
2.4.2 Relevante também é a definição das temáticas prioritárias de atenção da Rede, podendo ser estabelecido a consulta do representante a seus pares do serviço ou Instituição sobre as demandas e desafios mais urgentes postos, cotidianamente, ao serviço;
2.5 Caso ainda não seja de conhecimento pleno de todos os novos integrantes da Rede as atribuições de cada serviço, poderia ser oportunizado, aos representantes, conhecer o funcionamento dos outros serviços que compõem a Rede.
PASSO 3 – Aproximações sucessivas do Gestor Municipal com a Rede de Atenção e Proteção e Matriciamento:
3.1 Estabelecer contato com o Prefeito a fim de sensibilizá-lo acerca da relevância de apoiar a realização do trabalho em Rede no Município. Na ocasião, apresentar sucintamente, as fragilidades identificadas a partir da análise documental realizada e expor as estratégias iniciais elencadas, visando a aproximação com a Rede existente no Município, informando que estratégias de atuação posteriores serão definidas em conjunto com a Rede;
3.2 Oficiar ao Prefeito (
) para identificar as ações locais já realizadas ou em fase de execução propostas pelo Município relacionadas à temática da Política sobre Drogas;3.3 Oficiar a Regional de Saúde, Regional de Educação e Regional de Assistência Social (
) de referência do Município para identificar as ações locais e/ou regionais já realizadas ou em fase de execução propostas pela Regional relacionadas à temática de Política sobre Drogas;3.4 Caso julgue pertinente, solicitar ao CAEX/NATE a assessoria técnica interdisciplinar por assistentes sociais atuantes em cada URATE, assim como psicólogos(as) e pedagoga que atuam no CAEx/NATE/USSPP - 1ª URATE. A forma de solicitação dos assessores técnicos será acordada entre o CAEx e a coordenação do projeto SEMEAR, devendo-se seguir as orientações daí emanadas, tendo como primeiro objetivo justamente a identificação, endereço e funcionamento de todos os atores que de algum modo possam compor esta grande Rede de Atenção e Proteção Social ao Usuário de Drogas e seus Familiares;
3.5 Após a solicitação formal do assessoramento técnico é desejável que no primeiro momento haja um contato da Promotoria de Justiça para o repasse do que já é de conhecimento sobre o tema e também do que já foi realizado pelo Ministério Público. Cabe aos assessores técnicos do CAEx/NATE/USSPP colaborar na análise dos documentos solicitados ao Gestor Municipal, às Regionais de Saúde e aos Conselhos de Políticas sobre Drogas para fins de identificação da estrutura, organização e do movimento da grande Rede de Atenção e Proteção Social ao Usuário de Drogas e seus Familiares já existente, podendo colaborar de maneira técnica e específica no processo implantação/acompanhamento do Conselho, apresentando ao grande grupo em nova reunião justamente a identificação de todos oso colaboradores da Rede, endereço e forma de funcionamento, bem como telefones para contato;
3.6 Na hipótese de se adotar estratégia de intervenção interdisciplinar, necessário se faz remeter o Procedimento Administrativo à assessoria técnica do CAEx/NATE/USSPP de referência do Município (inclusive documentos recebidos em resposta aos Ofícios remetidos) para:
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Informar se foi realizada alguma recomendação de adequação ou se há Plano Setorial local (informar qual a temática);
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A partir da remessa documental, os assessores técnicos (assistente social/psicólogo) realizarão a análise das informações repassadas e realizarão uma devolutiva (mediante relatório, reunião, ou outra forma definida com a Promotoria de Justiça) acerca do cenário social identificado.
3.7 Identificar preliminarmente as principais demandas e as fragilidades existentes no Município a partir da análise documental realizada (tenha sido ela realizada exclusivamente pelo Promotor ou com a assessoria técnica do CAEx/NATE/USSPP);
PASSO 4 – Inclusão de agenda e de parceiros locais:
4.1 Agendar nova reunião da Rede e estabelecer uma agenda (a exemplo da formação de Comissões Temáticas ou da realização de Conferências Municipais, etc). A Mesa Diretiva deverá convidar os representantes de serviços (governamentais e não-governamentais), serviços conveniados e de órgãos da esfera estadual presentes no Município (MPPR, TJPR, ER da SEDS, NRE, Agência do Trabalhador, etc).
4.1.1 Sugere-se que dentre os representes da Rede estejam representantes dos: Conselhos de Políticas Sociais (Política sobre Drogas, Criança e Adolescente, Assistência Social, Saúde, Educação, etc), das Secretarias Municipais (representante da gestão e ao menos 01 representante por serviço/equipamento: Secretaria de Saúde, Assistência Social, Esporte e Lazer, Cultura, etc), Organizações não-governamentais, serviços conveniados, dentre outros. Representantes de órgãos da esfera estadual, como por exemplo, órgãos do Sistema de Justiça, da Regional de Saúde, do Núcleo Regional de Educação, Escritório Regional da SEDS, SEJU e Órgãos da Segurança Pública poderão ser convidados a colaborar no desenvolvimento do trabalho em Rede.
PASSO 5 - Fluxogramas e Protocolos de atendimento e funcionamento intersetorial:
5.1 Construção de fluxogramas e protocolos intersetoriais além de outros documentos considerados necessários à organização do processo de atendimento, acompanhamento e/ou encaminhamento das demandas;
PASSO 6 – Controle estratégico dos resultados em relação às ações implementadas:
6.1 Revisar, periodicamente, os fluxos e protocolos resultantes da construção coletiva dos instrumentos membros/representantes da Rede;
6.2 Avaliação dos resultados.
Texto de apoio sobre Redes:
http://www.neca.org.br/fumcad2009/2-enc-reg-01.09.09-texto-redes-isa.pdf
Modelos relativos à Rede de Atenção e Proteção Social no Município de Cascavel, fornecidos pela Promotoria de Justiça, que podem ser utilizados para a formação das Redes de Serviços para o Enfrentamento às Drogas:
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Atas, documentos e modelos utilizados para a formação da Rede de Enfrentamento às Drogas de União da Vitória:
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REFERÊNCIAS:
GUARÁ, Isa Maria F. Rosa (coord). Redes de Proteção Social. 1. ed. São Paulo: Associação Fazendo História: NECA - Associação dos Pesquisadores de Núcleos de Estudos e Pesquisas sobre a Criança e o Adolescente, 2010. (Coleção Abrigos em Movimento). Acesso em 16/Abr/2018. Disponível em: <https://www.neca.org.br/wp-content/uploads/Livro4.pdf>
GONÇALVES, Antonio Sérgio & GUARÁ, Isa Maria F. Rosa. Redes de Proteção na comunidade: por uma nova cultura de articulação e cooperação em Rede. Extrato de texto da Coleção ABRIGOS EM MOVIMENTO – sedh/neca 2009 - no prelo. Acesso em 17/Abr/2018. Disponível em:
MARINGÁ. Relatório final da 8ª Conferência Municipal de Políticas sobre Drogas. Maringá: 2017. Disponível em: <http://www2.maringa.pr.gov.br/sistema/arquivos/f7f969e496a0.pdf>
MPPR, Comitê de Enfrentamento às Drogas. Manual de orientação funcional do Projeto SEMEAR para o enfrentamento ao álcool, crack e outras drogas. Curitiba: MPPR, 2016.
MPPR, Projeto Estratégico SEMEAR. Terceira (3ª) fase do Projeto Estratégico SEMEAR: enfrentamento ao crack, álcool e outras drogas. Termo de Abertura do Projeto. 2018.
RONZANI, Telmo Mota et al. Redes de Atenção aos usuários de drogas: Políticas e Práticas. São Paulo: Cortez, 2015.
SENAD. Criando e fortalecendo Conselhos Municipais sobre drogas: participação e controle social. S/D. Acesso em: 16/Abr/2018. Disponível em<http://www.aberta.senad.gov.br/medias/original/201706/20170616-133049-001.pdf>
SOUZA et al. Política Nacional Sobre Drogas e Saúde Mental: Percepções Dos Gestores E Os Desafios Intersetoriais No Arranjo Político. In: Cadernos Brasileiros de Saúde Mental. ISSN 1984-2147, Florianópolis, v.5, n.11, p.67-87, 2013. Acesso em 17/Abr/2018. Disponível em:
1Eixos de atuação presentes na 3ª Fase do Projeto Semear:
A) Prevenção ao uso de drogas e formulação de políticas públicas sobre drogas;
B) Atendimento e reinserção social dos usuários de drogas;
C) Repressão ao tráfico;
D) Capacitação dos membros e servidores do Ministério Público em relação à temática da drogadição.