Um mandato de vida e morte

08/02/2013 | Por Rui Cavallin Pinto

José da Natividade Saldanha foi um dos membros da Revolução Pernambucana de 1824, conhecida por Confederação do Equador. Filho de padre e bacharel por Coimbra foi poeta, advogado, músico e político. Autor da História da Igreja Pernambucana, ele é hoje um dos patronos da Academia Pernambucana de Letras. Porém, durante o levante separatista que eclodiu em Pernambuco, em oposição ao governo imperial de D. Pedro I, José Saldanha integrou, como intelectual, as forças rebeldes, servindo como secretário da junta governativa presidida por Manoel de Carvalho Paes de Andrade e são desse tempo os relatórios que divulgou para justificar os objetivos da revolução e para servirem à história do movimento.

Ocorre, porém, que a insurreição foi vencida, seus líderes submetidos aos tribunais militares e sacrificados na forca, tendo os corpos dilacerados e expostos à execração pública. José da Natividade, porém logrou evadir-se, vencendo uma série de dificuldades que o conduziram primeiro aos Estados Unidos e depois à França e à Inglaterra, culminando por levá-lo a Caracas, na Venezuela.

No exílio, ao tomar conhecimento de sua condenação, remeteu a seu amigo, o bacharel Tomaz Xavier Garcia de Almeida, com atuação junto ao tribunal que o condenou, uma curiosa procuração, que Max Fleiuss extraiu dos arquivos do Instituto Histórico Geográfico do Brasil (do qual foi secretário perpétuo), com o seguinte teor:

José da Natividade Saldanha, bacharel em direito civil pela Universidade de Coimbra – advogado nos tribunais da República da Colômbia. Por esta bastante procuração, por mim feita e assinada, constituo meu bastante procurador, na província de Pernambuco, a meu colega Sr. Bacharel Thomaz Xavier Garcia de Almeida, para que, em meu lugar, como se eu próprio fora, possa morrer enforcado e sofrer qualquer castigo, das autorizações, as penas que a comissão militar julgar conveniente impor-me, pois para tudo lhe concedo os amplos poderes que o direito permite. Caracas, capital do departamento da Venezuela, da República da Colômbia, 19 de agosto de 1825. José da Natividade Saldanha.

 

Na verdade, Natividade nunca mais pôde voltar ao Brasil. Após sofrer grandes privações na Venezuela, onde passou a viver num convento e teve de vender as próprias roupas para não passar fome, acabou recebido por Simão Bolívar e se instalou temporariamente no país com banca de advogado. Da Venezuela passou para a Colômbia, onde foi professor de humanidades e ganhou certo prestígio local. De sua morte: constam, porém, diferentes versões: o historiador colombiano Gustavo Abaleda afirma que Natividade foi fuzilado em Cali, por ordem do general Obando. Para Pereira da Costa, teria morrido afogado ao cair numa vala da rua, numa noite de chuva, em Bogotá; e, ainda, que teria desaparecido após ter participado de uma tumultuada sessão do tribunal do júri.