Ronald Accioly, juiz e amigo
05/10/2020 | Por Rui Cavallin Pinto
Ronald Accioly Rodrigues da Costa foi meu colega de classe na Faculdade de Direito na UFPR. Formamos em 1953, na chamada turma do Centenário, data que ainda celebramos com seus últimos remanescentes. Ronald não era um líder, no rigor da palavra; faltava-lhe, por certo, o peito inflado e a voz de comando. Mas era sim um aliciador, um colega com o dom de agregar. Sabia tudo da escola e dos nossos deveres. E era a quem a gente perguntava tudo. Esse tipo de homem você nunca vê sozinho; está sempre rodeado de um grupo de amigos.
Também não era o melhor da classe, porque ali havia um Alcides Munhoz Neto, em quem todos nós projetávamos a imagem do futuro jurista, como logo chegou a ser, mas o destino contrariou. Quando era época de provas, habitualmente Ronald franqueava a casa na rua Carlos de Carvalho, onde reunia um grupo de colegas para rever e completar o estudo dos temas de exame, sob sua orientação. Assim, todos nós éramos bons alunos.
Ronald tinha também outra qualidade: era o nosso organizador de eventos. Se havia uma reunião ou um jantar era ele que tomava frente, com a colaboração de poucos.
Todo encontro realizado a cada ano, a festa era promoção sua e do colega Moisés Elias Kubrusly (in memoriam), na organização e no programa. Eles se encarregavam de tudo, faziam os convites e promoviam as festas em grande gala. E a gente ia e confiava neles.
Conheci mais tarde Accioly da Costa na Consultoria Jurídica do Estado, onde fez carreira que foi desde assistente administrativo a procurador-geral do Estado. Seguia sendo ainda o mesmo homem, simples, competente e afável.
Em 20 de abril de 1975, ascendeu a desembargador, na vaga constitucional de advogado, e, ao final da carreira, alcançou a presidência do próprio Tribunal de Justiça, em 1993-1994. Na ocasião, aposentado, fui então surpreendido com o convite para servir como seu assessor judiciário – tal como, de fato, vim a sê-lo por todo o tempo do seu mandato. Tive então um excelente convívio com ele e aprendi um pouco dessa arte difícil de ser juiz, tarefa para a qual nunca me reconheci dotado. Mas aprendi a admirá-lo no esforço diário de desfazer as armações e as tramas dos processos e seus recursos. Suponho tê-lo ajudado em muitas de suas dificuldades, que eram comuns. Diversas vezes, como seu assessor, quando, por acaso antecipava alguma opinião sobre qualquer dos temas que aguardavam sua decisão, em tantas dessas ocasiões ele até me segredava discretamente: “– Sabe que é isso que eu penso também?...”, e eu me sentia orgulhoso dessa concordância, porque me permitia imaginar que, de certo modo, eu tinha uma visão jurídica parecida com a dele, o que valorizava muito minha disposição de servi-lo. Assim, em razão de tudo isso, guardo desse curto período a impressão agradável de ter sido útil e de ter cumprido minha tarefa e, mais ainda, de ter tido a oportunidade de consolidar uma estima e admiração pessoal, que sempre alentei por ele, desde os primeiros tempos do nosso convívio. Ainda sobre essa identidade, tenho uma lembrança que recebi como honrosa homenagem, quando me premiou com o juízo: “Sabe que você poderia ter sido um bom juiz?”.
Por fim, tem ainda um particular que não posso deixar de registrar. Consultando as informações genealógicos, vejo que Accioli vem de Acciaiuoli, Acciajuoli, Accioli, Acyoly, nome de família de origem italiana, que, no Renascimento representou uma das mais importantes famílias de Florença. Aliás, em Florença tem o Palazzo Acciauoli, próximo da ponte Vecchio, com torre que proporciona uma bela visão da cidade. O ramo português veio de Simone, conhecido como Simão Achioli, almoxarife régio da Madeira. O ramo brasileiro começou com Gaspar Acciaiuoli, casado no Brasil com a neta de família nobre e guelfa de Florença, portadores da certidão de nobreza assinada pelo Grão-Duque da Toscana.
Não é à toa, portanto, que Ronald Accioly Rodrigues da Costa tivesse orgulho de exibir seu gene de origem, revelado pelos modos distintos e gestos de fidalguia e inteligência que marcaram sua presença superior entre nós.