Minha vida (com Munir Gazal)

16/08/2023 | Por Izabela Kodaka

Março de 1960

Todas as manhãs, quando passava na Igreja de São Francisco de Paula para assistir a missa das 6h, o mesmo fazia um rapaz, que naquele tempo não sabia se ia para aulas ou para trabalhar.

Ele vinha pela Rua José Nicolau Abagge, esquina da minha, Rua Desembargador Motta, que também fazem esquina com a Rua Saldanha Marinho. Com o passar do tempo, num domingo, depois da missa, quando estava na janela do meu quarto, apreciando os movimentos dos passantes, chegou o dito rapaz no ponto de ônibus e, olhando pra mim, me convidou para irmos a uma matinê, ao que respondi que não sairia com uma pessoa que nem conhecia.

Depois de alguns anos, ele, o Munir Gazal, apareceu na Procuradoria Geral do Estado (atual Procuradoria-Geral de Justiça), juntamente com Carlos Masaru Kaimoto e Olympio de Sá Sotto Maior Neto, para assistir aulas da Escola do Ministério Público, curso que tinha a duração de dois anos e que eles frequentavam todas as quartas-feiras. Olympio, já o conhecia, porque ele fazia estágio no escritório do Mauro João Sales de Albuquerque Maranhão, do Dr. Guilherme de Albuquerque Maranhão (onde eu trabalhava como secretária do Mauro no período da manhã; desde meados de 1969, os membros do Ministério Público foram proibidos de atuar como advogados e tiveram que repassar os processos ao Mauro, que iria se formar no curso de Direito). Olympio, sobrinho do deputado estadual Ivan Ruppel, que era amigo do Guilherme Maranhão.

Terminado o curso, como em seguida teve concurso de promotor público substituto, eles enfrentaram o dito concurso.

Do Carlos Masaru Kaimoto e do Olympio sabia que haviam obtido êxito na aprovação, porque o Kaimoto era amigo e vizinho de apartamento, e Carlos Alberto Dissenha também era vizinho e sempre aparecia na Divisão Judiciária. Porém, não tinha conhecimento da aprovação do Munir.

Depois de passados alguns anos, fui me inteirar de que ele também era promotor em Assaí, justo no município onde nasci.

Quando ele foi convocado para trabalhar na capital e foi designado para ser promotor substituto no Tribunal do Júri, ali ele elevou seu conceito de promotor brabo e temeroso para quem seria julgado. Inclusive, fui assistir a júris dele, junto com o João Kopytowski, que tinha vindo cursar a Escola do Ministério Público e veio trabalhar no Departamento Judiciário comigo.

Com o passar dos anos, Munir Gazal já era promotor de entrância final de Londrina e veio convocado para trabalhar como assessor do Gabinete do procurador-geral de Justiça. Nesse período, a funcionária Marisa, que sempre procurava casos com alguns membros ministeriais, começou a namorar com ele, mas ela tinha um ciúme doentio com qualquer pessoa com quem se relacionava.

Uma coisa que eu não suportava no Munir era o fato de ele ser fumante inveterado, e ainda por cima gostava muito do cachimbo. Nem precisava adentrar no corredor para sentir o cheiro, porque ele tinha o costume de acender o cachimbo já ao sair do elevador.

Continuou assim nos anos posteriores, até que o Dr. Olympio passou a ser procurador-geral – e quis me exonerar do cargo de chefe do Gabinete Geral para nomear a Marisa, mas não conseguiu por exigência dos demais procuradores de Justiça do Conselho Superior – e aceitei o desafio de organizar o Cartório do Patrimônio Público, Criminal e Civil, quando ele me mandou ir organizar o tal espaço, cujo coordenador era o Munir Gazal.

Minha sina contra o tabaco foi em vão! Ali, todos os membros tinham esse maldito vício. Tive que aguentar até o final das minhas jornadas de trabalho no MP.

Durante nosso convívio diário, o Munir e eu acabamos nos tornando amigos, a ponto de que até os assuntos particulares da vida dele, inclusive questões financeiras, ele acostumou a confiar a mim e a pedir para eu resolver.

Chegou a me chamar para eu cuidar de tudo quando ele fez cirurgia, no Hospital Santa Cruz, porque tinha interrompido amizade com o assessor dele, Mário Augusto Drago de Lucena, e passara a ter com ele apenas convívio profissional, não o colocando à disposição, respeitando que o assessor estava se preparando para o concurso de promotor substituto do MP.

Durante 10 anos, eu quem organizava desde aquisições de matérias de trabalhos, assuntos sociais, comemorações de aniversariantes do mês, reuniões, congraçamentos de fim de ano...

Quando a Maria Tereza Uille Gomes assumiu a chefia da instituição, como era de praxe, coloquei o cargo que ocupava à disposição. Munir Gazal ficou furioso, dizendo que eu não tinha que fazer isso! Ele não havia prestado atenção quando levei para ele assinar.

Quem me contou que ele esbravejava e gritava por mim sempre que surgia algo que não dava certo – “Iza, cadê você, que me abandonou?!” – foi a auditora da parte de sonegação fiscal, Maria Lucia da Cruz. Mas logo que o Patrimônio mudou de endereço, ele se aposentou.