Dados e Indicadores
Dados sobre a deficiência no Brasil
O ano de 2007 é um marco no avanço das garantias e direitos da pessoa com deficiência no Brasil, pois foi neste ano que o país assinou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD) e seu Protocolo Facultativo (PF), adotados na Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) no dia 13 de dezembro de 2006. Em 9 de julho de 2008, a CDPD e o PF foram ratificados pelo Brasil e inseridos no ordenamento jurídico pátrio com status equivalente ao de Emenda Constitucional pelo Senado através do Decreto Legislativo n° 186 e, por meio do Decreto n° 6.949/2009, foram, finalmente, promulgados.
Em que pese este contexto de avanço normativo, ainda não houve repercussão satisfatória na necessária produção de dados e indicadores específicos sobre as diversas análises necessárias acerca das pessoas com deficiência no Brasil e nos estados. É possível observar que a maior parte dos indicadores presentes nos estudos, notícias e demais divulgações que dizem respeito às pessoas com deficiência utiliza como referência os dados obtidos pelo IBGE com a realização do Censo Demográfico 2010, por meio do qual constatou-se que mais de 45,6 milhões de pessoas no Brasil, ou seja, o equivalente a 23,9% da população do país, declarou ter algum tipo de deficiência.
Na divulgação da análise dos dados da pesquisa, o IBGE destacou que, em razão da modificação do conceito de deficiência ao longo dos anos, não era possível uma comparabilidade direta entre os dados obtidos no Censo 2010 e os obtidos nos levantamentos anteriores, e também salientou, sobre a metodologia de pesquisa, que:
“as perguntas formuladas buscaram identificar as deficiências visual, auditiva e motora, com seus graus de severidade, através da percepção da população sobre sua dificuldade em enxergar, ouvir e locomover-se, mesmo com uso de facilitadores como óculos ou lentes de contato, aparelho auditivo ou bengala, e a deficiência mental ou intelectual”.
No ano de 2012, a fim de satisfazer diretriz do artigo 35, item 1 da Convenção sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência [1], o Brasil entregou o 1º Relatório Nacional da República Federativa do Brasil sobre o cumprimento das disposições da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, documento que cobre o período compreendido entre os anos de 2008 e 2010 e sobre o qual o Comitê de Direitos Humanos da Pessoa com Deficiência ONU emitiu “Observações Conclusivas” em setembro de 2015.
Insta salientar que, especificamente no que diz respeito à coleta de dados e estatísticas, o Relatório Nacional expôs em seu item 172 que, por meio dos resultados obtidos após os resultados do Censo 2000, havia ficado uma lição referente a “necessidade de estimativas intercensos para a harmonização de indicadores”, a qual foi implementada pelo IBGE na realização do Censo 2010.
No mesmo sentido, o Comitê da ONU destacou nas Observações sobre o Relatório encaminhado pelo Brasil que uma preocupação era o fato de não haver coleta sistemática de dados específicos e estatísticas em relação a temas como pessoas com deficiência vítimas de abuso, exploração e violência; número de famílias com crianças com deficiência que possuem acesso a apoios comunitários (como os Centros de Referência Especializada de Assistência Social - CREAS), bem como dados sobre todos os setores, observando critérios em função do sexo, idade, deficiência, povos indígenas e localização geográfica, e recomendou expressamente no item 57:
“[…] que o Estado parte facilite sistematicamente a coleta, análise e disseminação de dados desagregados em todos os setores, incluindo saúde, educação, emprego, participação política, acesso à justiça, proteção social, violência por deficiência e de acordo com outras categorias listadas acima, e altere as perguntas do censo, em cooperação próxima com organizações de pessoas com deficiência para refletir precisamente a população.”
No ano de 2011, a Organização Mundial da Saúde, em conjunto com o Banco Mundial produziu o Relatório Mundial sobre deficiência, que reconhecendo a falta de consciência e informação científica sobre as questões relativas à deficiência teve dois principais objetivos:
1. Oferecer aos governos e à sociedade civil uma descrição abrangente da importância da deficiência, além de uma análise das respostas obtidas com base na melhor informação científica disponível.
2. Com base nesta análise, fazer recomendações para a ação nos níveis nacional e internacional.
Destaque-se que no Capítulo 2: Deficiência – uma visão global, o referido Relatório faz uma observação fundamental e convergente com aquela apresentada pelo IBGE na análise dos dados do Censo 2010 e também pelo Comitê de Direitos Humanos da Pessoa com Deficiência ONU em relação às metodologias de pesquisa utilizadas atualmente e os dados obtidos, pois afirma:
“As normas internacionais sobre dados e grupos padronizados de perguntas podem melhorar a harmonização entre as diversas abordagens. Nos últimos anos têm havido tentativas de padronizar as pesquisas sobre deficiências (ver Apêndice Técnico B) (22, 23). Mas as definições e metodologias usadas variam tão amplamente entre os países que as comparações internacionais ainda são difíceis. Isso também torna mais difícil para os signatários da CDPD monitorar seu progresso na implementação da Convenção com relação a um conjunto de indicadores comuns.” (grifou-se)
Já no ano de 2015, o IBGE divulgou a Pesquisa Nacional de Saúde 2013: ciclos de vida, realizada em convênio com o Ministério da Saúde e que apresenta, dentre várias outras informações, dados sobre as pessoas com deficiências temporária ou permanente, progressiva, regressiva ou estável e intermitente ou contínua, referentes a quatro tipos de deficiências: intelectual, física, auditiva e visual.
A partir dos dados obtidos através desta pesquisa, observa-se que das 200,6 milhões de pessoas residentes em domicílios particulares permanentes no Brasil, 6,2% possuía ao menos uma das deficiências investigadas, sendo a deficiência intelectual a menos frequente e a visual a mais representativa na população.
Como se pode observar através dos Anais da 4ª Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, realizada em Brasília em 2016, a necessidade de concretização de um sistema de coleta de dados mais efetivo foi uma das preocupações presentes durante as discussões. Neste sentido, uma das propostas no “Eixo I – Gênero, raça e etnia, diversidade sexual e geracional” [2] diz respeito a:
“Incluir, no orçamento do Ministério da Ciência e da Tecnologia, uma dotação de 0,8% para instituições públicas e privadas de pesquisa científica e de atendimento às pessoas com deficiência para mapeamento e produção de dados sobre o perfil dessas pessoas, considerando as diferenças de renda, raça, gênero, geração, orientação sexual, território, e disponibilizando o conhecimento produzido em formato acessível.” (grifou-se)
No Eixo II – Órgãos gestores e instâncias de participação social, também se observa proposta relacionada à necessidade de aprimoramento do sistema de coleta de dados utilizado pelo IBGE:
Alterar e ampliar a metodologia de levantamentos estatísticos sobre as pessoas com deficiência realizado pelo IBGE e criar instrumento legal que garanta que o/a gestor/a faça uso dessas estatísticas na implementação de políticas públicas direcionadas a pessoas com deficiência. (grifou-se)
Entre as ações estratégicas colocadas como propostas ao Poder Executivo, ainda consta nas Diretrizes 7 e 28, respectivamente:
“Articular ações em rede para mapeamento quantitativo e qualitativo das pessoas com deficiência.
[…]
Aprimorar as pesquisas do IBGE, acerca da condição de pessoas com deficiência, no que se refere a: a) Capacitação de pessoal; b) Caracterização da pessoa com deficiência.”
Dados sobre a deficiência no Estado do Paraná
Dados esclarecedores envolvendo as pessoas com deficiência no Estado do Paraná, foram disponibilizados no livro “Retratos da Deficiência no Brasil”, fruto de uma parceria entre a Fundação Bando do Brasil e a Fundação Getúlio Vargas, pois especificam que o estado encontrava-se entre os cinco com menores taxas de pessoas com deficiência no ranking envolvendo todos os estados do país, tendo como referência dados obtidos no Censo 2000. Vejamos:
Também estão disponíveis no site do IBGE dados da “amostra – pessoas com deficiência”, referentes ao Estado do Paraná, com relação ao sexo, à idade e à situação de ocupação deste segmento populacional, obtidos por meio da realização do Censo 2010, os quais podem ser acessados através do link: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/pr/pesquisa/23/23612?
No Caderno IPARDES, do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social, divulgado no segundo semestre de 2012, foi publicado o artigo “PESSOAS COM DEFICIÊNCIA SEVERA NA REGIÃO SUL DO BRASIL: CARACTERÍSTICAS DA POPULAÇÃO SEGUNDO OS CENSOS 2000 E 2010” que, através de uma análise comparativa entre os dois Censos, descreve a situação deste segmento mais específico nos Estados da Região Sul, observando a distribuição de atributos como sexo, idade, situação do domicílio, escolaridade, PIA e PEA, entre outros.
Sistema de informações – Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos das Pessoas com Deficiência
A Secretaria Especial dos Direitos da Pessoa com Deficiência do Ministério da Justiça e Cidadania é uma fonte importante para obtenção de dados e informações sobre o tema pertinente a pessoa com deficiência, pois tem como uma de suas atribuições manter e gerenciar o sistema nacional de informações sobre deficiência, disponibilizando em sua página eletrônica diversos conteúdos que dizem respeito a temática e dentre os quais se destacam os relatórios sobre “Pessoa com deficiência e AIDS” e “Pessoas com deficiência privadas de liberdade”.
Considerações
Não resta dúvida quanto a importância da coleta de dados e produção de indicadores capazes de refletirem a realidade das pessoas com deficiência no Brasil e no Estado do Paraná.
Mais do que isso, verifica-se a manifesta necessidade de implementação de um sistema de coleta de dados que demonstre de forma padronizada e consistente a situação desta parcela da sociedade.
Por meio de dados atualizados e indicadores condizentes com a nova legislação que trata do tema, será possível uma atuação ainda mais efetiva do Ministério Público na proteção e busca pela implementação dos direitos desta parcela da sociedade que por tanto tempo teve seus direitos ignorados.
[1] CDPD: artigo 35: Relatórios dos Estados Partes: 1.Cada Estado Parte, por intermédio do Secretário-Geral das Nações Unidas, submeterá relatório abrangente sobre as medidas adotadas em cumprimento de suas obrigações estabelecidas pela presente Convenção e sobre o progresso alcançado nesse aspecto, dentro do período de dois anos após a entrada em vigor da presente Convenção para o Estado Parte concernente. 2.Depois disso, os Estados Partes submeterão relatórios subseqüentes, ao menos a cada quatro anos, ou quando o Comitê o solicitar. 3.O Comitê determinará as diretrizes aplicáveis ao teor dos relatórios. (...)
[2] Os debates da Conferência foram divididos em três eixos: a) Eixo I – Gênero, raça e etnia, diversidades sexual e geracional; Eixo II – Órgãos Gestores e Instâncias de Participação Social; e Eixo III – A interação entre os Poderes e os entes federados.