Relevantíssimas modificações na Lei dos Crimes Raciais 13/01/2023 - 10:43
Nesta semana (11 de janeiro de 2023), a Presidência da República sancionou e publicou a Lei nº 14.532/2023, que alterou a Lei nº 7.716/1989 (Lei dos Crimes Raciais) e o Decreto-Lei nº 2.848/1940 (Código Penal), com quatro modificações principais: a) tipificação da injúria racial como crime de racismo; b) inserção da pena de suspensão de direito em caso de racismo praticado no contexto de atividade esportiva ou artística; c) previsão de pena específica para os racismos religioso ou recreativo, assim como para o praticado por funcionário público; e d) a introdução de norma de hermenêutica para o reconhecimento de discriminações.
A referida Lei agora conta com o Art. 2º-A, segundo o qual "injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia ou procedência nacional", é punido com pena de reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. Ainda, de acordo com o seu parágrafo único, a pena é "aumentada de metade se o crime for cometido mediante concurso de 2 (duas) ou mais pessoas”.
A injúria racial passou a formalmente integrar o rol dos crimes da Lei nº 7.716/89 (Lei dos Crimes Raciais), de modo que se mostra incorreta a afirmação de que a injúria racial “se equipararia ao racismo”. Esse crime é uma das modalidade dos crimes de racismo.
Essa modificação legislativa vem ao encontro do entendimento já acolhido pelo MPPR e pelo STF, no sentido de que a injúria racial configura crime de racismo, com todos os seus efeitos constitucionais. O artigo 5º, da Constituição Federal, definiu o crime de racismo como inafiançável e imprescritível, ou seja, o autor do delito, uma vez preso, não pode ser solto mediante o pagamento de fiança, e a punição daquele que o comete pode ocorrer a qualquer tempo, independentemente da data de ocorrência do fato e sem a incidência de qualquer causa interruptiva da prescrição.
Além disso, a injúria racial não mais depende de representação do ofendido para ser investigada e processada, tratando-se, portanto, de crime de ação penal pública incondicionada.
Ainda, importante dizer que as condutas de injúria LGBTIfóbica ou xenofóbica também estão contempladas pelo tipo pena do mencionado Art. 2º-A.
Outra mudança significativa se encontra no artigo 20, da mesma Lei dos Crimes Raciais, que prevê o crime de prática ou indução de discriminação ou preconceito, que agora possui o § 2º-A, estabelecendo punição, com reclusão de dois a cinco anos e proibição de frequência por três anos a locais específicos, quando cometido no contexto de atividades esportivas, religiosas, artísticas ou culturais destinadas ao público. Ao mesmo artigo 20 foi acrescentado o § 2º-B, que criminaliza quem obstar, impedir ou empregar violência contra quaisquer manifestações ou práticas religiosas.
O racismo recreativo também agora configura causa especial de aumento de pena, uma vez que, conforme o novo artigo Art. 20-A, terão as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade, quando ocorrerem em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação.
Igualmente, nos termos do Art. 20-B, os crimes de racismo cometidos por servidores públicos no exercício da função terão as penas aumentadas de 1/3 (um terço) até a metade.
Por fim, relevantíssimo instrumento de interpretação antirracista é fornecido pelo novo Art. 20-C. O dispositivo apresenta chave hermenêutica para a interpretação da legislação criminal antidiscriminatória, estabelecendo que "o juiz deve considerar como discriminatória qualquer atitude ou tratamento dado à pessoa ou a grupos minoritários que cause constrangimento, humilhação, vergonha, medo ou exposição indevida, e que usualmente não se dispensaria a outros grupos em razão da cor, etnia, religião ou procedência.”